Cultura 7 setembro, 2020

Fundação José Saramago, a instituição que preserva as ideias e as obras do célebre escritor português

Instituição cultural com sede na Casa dos Bicos, em Lisboa, a Fundação José Saramago foi constituída pelo próprio escritor em junho de 2007, e tem como objetivos a defesa e difusão da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a defesa do meio ambiente e a promoção da cultura em Portugal e em todo o mundo.

O edifício está localizado próximo ao Tejo e à Praça do Comércio, em uma rua com cafés, restaurantes e outros centros culturais — como o Museu do Fado, que visitamos anteriormente.

Em Junho de 2012 a Fundação José Saramago mudou-se para a Casa dos Bicos e abriu as portas para o público, com uma exposição permanente sob o título “A Semente e os Frutos”.

Veja os detalhes de nossa visita à Casa dos Bicos clicando aqui

A exposição inclui toda a biblioteca do escritor, seus manuscritos, fotografias, notas pessoais, agendas. Também se encontram expostas as obras escritas e traduzidas por Saramago, além de referências que remetem à família, amizades, atividades literárias, cívicas e políticas.

O Diretor da Fundação José Saramago, Sérgio Machado Letria, compartilhou conosco alguns elementos da exposição que devem ser destacados, como os cadernos de capa preta. O autor tinha o hábito de, para cada livro que começava a escrever, abrir um caderno de capa preta e escrever notas sobre a construção do romance. E de alguma forma, estes documentos permitem aos leitores terem acesso à cabeça do escritor e a forma como ele pensava no livro que estava escrevendo.

Outro item de destaque no acervo são as várias agendas de José Saramago, que assim como os cadernos, dão a ideia de meticulosidade, ética e organização do escritor no trabalho.

Nestas agendas, é possível perceber esta capacidade organizativa, observando como José Saramago anotava desde livros que lia, filmes que assistia, peças de teatro que ia prestigiar, bem como as reuniões políticas que participava, como militante do Partido Comunista Português.

Ali também estão anotadas as suas viagens e os valores que tinha para receber pelos seus trabalhos como tradutor ou revisor. São, portanto, documentos muito interessantes para que possamos ter uma noção do que era a vida do homem, além da vida do escritor.

Há ainda duas crônicas que foram publicadas pelo jornal “A Capital”, de Lisboa, em 1968. São dois textos dedicados aos seus avós, que foram figuras de extrema importância em sua vida, de tal forma que quando recebeu o Prêmio Nobel de Literatura, José Saramago inicia o discurso mencionando “o homem mais sábio que conheci em toda minha vida não sabia ler nem escrever” – referindo-se ao seu avô, Jerônimo.

Fazem parte do acervo os originais das suas crônicas, que são belíssimos textos em que o escritor fala sobre como os avós eram e como viviam, e a influência que exerceram na sua construção enquanto homem.

Uma reprodução cenográfica do escritório de José Saramago é um dos destaques da exposição, incluindo sua escrivaninha e objetos pessoais, além dos óculos e máquina de escrever utilizados pelo escritor.

Auto-biografia de José Saramago

Em sua autobiografia, José Saramago conta que nasceu em uma família de camponeses , sem terra, em Azinhaga, uma pequena povoação situada na província do Ribatejo.

Seus pais chamavam-se José de Sousa e Maria da Piedade.

José de Sousa teria sido também o nome do autor, caso o funcionário do Registro Civil, por sua própria iniciativa, não lhe tivesse acrescentado a sobrenome pelo qual a sua família era conhecida na aldeia: Saramago.

Somente aos sete anos de idade, ao apresentar um documento de identificação na escola primária, é que descobriu que o seu nome completo era José de Sousa Saramago.

Não foi este, porém, o único problema de identidade enfrentado. Embora nascido no dia 16 de Novembro de 1922, os seus documentos oficiais informavam que seu nascimento havia sido em 18 de Novembro, ou seja, 2 dias após a data correta. De acordo com a autobiografia de Saramago, foi graças a esta pequena fraude que a família escapou do pagamento da multa por falta de declaração do nascimento no prazo legal.

José de Sousa Saramago foi um excelente aluno na escola primária: na segunda classe já escrevia sem erros de ortografia. A terceira e a quarta classe foram feitas em um só ano. Entretanto, por falta de recursos financeiros, abandonou o Liceu e transferiu-se para uma escola de ensino profissional, onde se formou como serralheiro mecânico.

Em 1947, ano do nascimento de sua única filha, chamada Violante, publicou seu primeiro livro, um romance intitulado “A Viúva”, mas que por conveniências editoriais foi publicado com o nome de “Terra do Pecado”.

Seis anos depois, em 1953, José Saramago terminou o romance “Claraboia’, publicado apenas depois da sua morte.

No final dos anos 50 tornou-se responsável pela produção na editora Estúdios Cor, função que conjugaria com a de tradutor e de crítico literário. Regressou à escrita em 1966 com “Os Poemas Possíveis”, seu primeiro livro de poesias.

No princípio de 1976 instalou-se em Lavre para documentar o seu projeto de escrever sobre os camponeses sem terra. Assim nasceu o romance “Levantado do Chão” e o modo de narrar que caracterizou a sua ficção novelesca.

Com exceção da peça de teatro “A Segunda Vida de Francisco de Assis”, publicada em 1987, a década de 80 foi dedicada ao romance: “Memorial do Convento”, que consagrou José Saramago internacionalmente.

Em 1991, foi publicado “O Evangelho segundo Jesus Cristo”, obra vencedora do Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores e do Prémio Bracatti.

Em 1995, a reconhecida obra o “Ensaio sobre a Cegueira” foi publicada e José Saramago foi contemplado com o Prémio Camões.

No ano de 1998, José Saramago foi o primeiro ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em língua portuguesa. Nas palavras da Academia Sueca, um merecimento “…pela sua capacidade de tornar compreensível uma realidade fugidia, com parábolas sustentadas pela imaginação, pela compaixão e pela ironia”.

Até 2010, ano da sua morte, José Saramago construiu uma obra incontornável na literatura portuguesa e universal, com títulos que vão de “Caim”, até “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, passando por “Todos os Nomes” e “A Viagem do Elefante”, obras traduzidas em todo o mundo.

Suas obras foram traduzidas em mais de 40 idiomas e publicadas em mais de 60 países, e estão expostas na exposição da Fundação José Saramago.

Denso e irônico, inteligente e cético, terno e sarcástico, demolidor e pertinaz nas suas críticas, Saramago praticou, ao longo da sua produção narrativa, tanto a desmistificação da história convencional como a censura ativa dos desvios contemporâneos, tomando sempre como referência a essência humana da vida, a solidariedade, a compaixão, o respeito pelo outro e a relatividade do ponto de vista.

E terminamos por aqui a nossa visita à Fundação Jose Saramago. Uma instituição que respeita a obra, a vida do escritor, e que faz com que o conceito de esperança seja algo mais que um vocábulo vazio e retórico.

Clique no botão abaixo e confira o vídeo de nossa visita com os comentários de Sérgio Machado Letria, o Diretor da Fundação José Saramago!

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